AS “MARIAS” DO BRASIL FAZEM HISTÓRIA

Em maio de 1983, Maria da Penha Maia Fernandes, com 38 anos de idade, dormia quando o então marido, o professor universitário colombiano Marco Antônio Heredia Viveros, deu um tiro nas costas dela. O pai de suas três filhas, na época com idades entre 02 e 06 anos, simulou um assalto. A biofarmacêutica com mestrado pela USP ficou paraplégica. Após quatro meses no hospital, ao voltar para casa, em Recife, nova tentativa de assassinato. Viveros tentou eletrocutá-la. O caso chegou à Comissão Interamericana dos Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA), que acatou, pela primeira vez, a denúncia de um crime de violência doméstica e condenou o Brasil pela omissão, tolerância e impunidade com que tratava os casos de violência doméstica e recomendou ações como mudar a legislação para coibir a violência contra a mulher.

Daí então, Maria da Penha virou símbolo contra a violência doméstica, inclusive emprestou seu nome a uma das mais populares leis brasileiras, a “Lei Maria da Penha”, que trata com rigor da violência doméstica e familiar.

Um novo debate aflora no País, envolvendo também a mulher, agora vítima de abuso sexual, ainda criança com 12 anos de idade.

Em uma ação julgada pela 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça – STJ, no dia 27 de março de 2012, o réu era acusado de ter estuprado três menores, todas de 12 anos. No julgamento do caso, a Eminente Ministra Relatora, Maria Thereza de Assis Moura, entendeu que a presunção de violência no crime de estupro tem caráter relativo e pode ser afastada diante da realidade concreta, mesmo quando o crime foi supostamente praticado contra menores de 14 anos. Assim fundamentou a Ministra Maria Thereza: “Não se pode considerar crime fato que não tenha violado, verdadeiramente, o bem jurídico tutelado — a liberdade sexual —, haja vista constar dos autos que as menores já se prostituíam havia algum tempo.” Segundo a Ministra, “o direito não é estático, devendo, portanto, se amoldar às mudanças sociais, ponderando-as, inclusive e principalmente, no caso em debate, pois a educação sexual dos jovens certamente não é igual, haja vista as diferenças sociais e culturais encontradas em um país de dimensões continentais”. (extraído do site “stj.gov.br” – noticia acessada mais de 41.180 vezes)

A Ministra da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, Maria do Rosário, manifestou, no dia 28 de março de 2012, sua indignação com o entendimento do STJ sobre estupro de vulneráveis, ela sustentou que, ao afirmar que não há culpa porque as meninas “tinham uma vida sexual anterior e de longa data”, a sentença acaba “julgando a vítima e não o acusado do crime”. (extraído do site “bol.com.br”).

O Escritório Regional para América do Sul do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ONU) entende que “a decisão do STJ abre um precedente perigoso e discrimina as vítimas com base em sua idade e gênero”. “É impensável que a vida sexual de uma criança possa ser usada para revogar seus direitos”,afirmou no texto o representante regional do alto comissariado para a América do Sul, Amerigo Incalcaterra.

Tamanha a repercussão do caso, que no dia 04 de abril de 2012, o STJ publicou em seu “site” uma nota denominada “Esclarecimentos à Sociedade”, onde, em resumo, esclareceu que “a decisão trata apenas da existência ou não, na lei, de violência imposta por ficção normativa, isto é, se a violência sempre deve ser presumida ou se há hipóteses em que menor de 14 anos possa praticar sexo sem que isso seja estupro.”. O presidente do STJ, Eminente Ministro Ari Pangendler, admitiu na nota que “…nada impede, porém, que o STJ, no futuro, volte a interpretar a norma, e decida de modo diverso.”

Sem adentrar no merito da ação, mesmo porque a competencia da decisão é exclusiva do Egrégio Superior Tribunal de Justiça e deve sempre ser respeitada, sou da opinião que nossas mulheres, estejam com 12 ou 38 anos de idade, devem sempre ser protegidas, principalmente as crianças abandonadas em praças, sem formação psicológica, desamparadas pela família, vítimas da exclusão social, precisam da proteção dos governantes, dos legisladores, dos operadores de direito, de toda a sociedade.

A sociedade precisa sempre proteger as meninas mulheres, as pequenas “marias”, para que elas cheguem no futuro como as do mundo contemporâneo, que além de mãe, esposa e dedicadas aos filhos, são cantoras (Maria Bethânia, Maria Gadú), atrizes (Maria Fernanda Cândido, Maria Padilha), presidem até empresa de petróleo (Maria das Graças Foster é presidente da Petrobrás), são professoras (Maria Nazareth Grilo de Barros foi exemplo de mãe e educadora). Embora as mulheres tenham, indiscutivelmente, competência igual a dos homens, continuam e sempre serão “sexo frágil”, precisam de proteção, para que não fiquem vitimadas por conta da superioridade física e da covardia de alguns criminosos.

Encerro com as palavras do cantor Milton Nascimento: “Maria, Maria é um dom, uma certa magia, uma força que nos alerta, uma mulher que merece viver e amar como outra qualquer do planeta…”

ERICO VERISSIMO GRILO DE BARROS, é advogado, pós-graduado em Direito Público e em Direito Processual Civil.

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About Giácomo Costanti

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3 Responses to AS “MARIAS” DO BRASIL FAZEM HISTÓRIA

  1. Avatar de vigilante alerta vigilante alerta disse:

    É um retrocesso, mas digamos , uma mostra de que a lei no Brasil favorece e muito o acusado e pune a vitíma, através de brechas de um sistema arcaico de regras.
    Mas o nosso país, por incrível que pareça, acha mais fácil dar flores as mulheres no dia 8 de março e assim fazer uma mostra mentirosa de igualdade, do que encarar com coragem os grandes problémas que essa diferença traz tanto em qualidade de vida as mulheres e crianças menos favorecidos, no campo do mercado de trabalho, educação e saúde. São propagandas de cervejarias e cantores, que por de trás de um comercial “engraçado” e musicas com palavras chulas, mostram as mulheres como objeto, ou seja, passam uma idéia que vai contra o respeito e as idéias de igualdade que tanto é pregado da boca pra fora, mas que está longe de se concretizar.

  2. Avatar de giovani giovani disse:

    legal Érico, concordo com você!!!!!!!
    Minha mãe também era Maria…..Maria do Rosário

  3. Avatar de sandra sandra disse:

    Erico , você é realmente sensacional, por isso ergo a sua bandeira para todas as pessoas, propago todos os dias a sua competência a todas as pessoas que converso, por sua causa e da Vanessa, recuperei o meu sonho que já tinha se tornado um pesadelo, sei que agora posso seguir essa carreira tão brilhante que é o Direito. Vocês me trouxeram de volta , serei responsável, sincera, honesta,capacitada como vocês, chegarei ao topo dessa profissão e me espelharei em vocês dois, somente assim, alcançarei a vitória.
    Parabéns pelas suas palavras ditas acima e por ser tão valioso, com essa família tão maravilhosa que constituiu.
    Abraços/Sandra.

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